Para explicar a origem da data e seu significado para o Brasil, O POVO entrevistou Hilário Ferreira, mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador da história e da cultura do povo negro no Estado.
Consciência Negra: Qual a origem da data?
O dia da Consciência Negra tem origem no movimento negro no Brasil. Desde o início da década de 1970, a instituição de uma data alusão ao povo negro tem sido tema de reflexões entre militantes negros .A única data que havia na época era o dia 13 de maio, que marca a Abolição da Escravatura.
Entretanto, o dia 13 de maio traz a ideia da princesa branca que libertou os escravizados, em alusão à Princesa Isabel, que assinou a Lei Áurea. “Segundo a historiografia oficial, a mensagem implícita desse do Treze de Maio é a abolição como uma dádiva dos brancos”, aponta o professor Hilário Ferreira.
Assim, a evocação do dia vinte de novembro como dia da Consciência Negra é lançada nacionalmente em 1971 pelo grupo Palmares, de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Em 1979, a discussão continua com a criação do movimento negro unificado.
Consciência Negra: Por que o Dia da Consciência Negra não é um feriado nacional?
Apesar da importância social da data, o Dia da Consciência Negra não é considerado feriado nacional. Ele é visto legalmente como um dia de reflexão a ação contra o racismo e a favor da equidade racial. A data foi ratificada pelo Poder Executivo em 2011, na lei 12.519, sob o governo da então presidente Dilma Rousseff. Mesmo com a norma, não é considerado um feriado em todo o País.
Em seis estados do Brasil a data é feriado estadual: Alagoas, Amazonas, Amapá, Mato Grosso, Rio de Janeiro e São Paulo.
Consciência Negra: Significado e importância do dia 20 de novembro
O dia da Consciência Negra nasce no movimento negro em referência a Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, situado entre os estados de Alagoas e Pernambuco. Ele foi assassinado em 20 de novembro de 1695.“(Zumbi) veio de uma organização negra africana contra o sistema escravista, os quilombos. Então nada mais representativo do que isso. Essa data se torna o dia da Consciência Negra”, explica Ferreira.
As tradições de uma sociedade são representadas também pelas datas comemorativas, já que essas datas ritualizam e consolidam o evento na mente das pessoas. Por isso, o dia da Consciência Negra, como um tributo à história do povo negro no Brasil, deixa mais evidente a causa que ele representa.Para o professor, “o ritual reproduzido diariamente abre espaço para discutir e debater o racismo no Brasil e as conquistas, no caso das políticas afirmativas”.
Segundo a Fundação Cultural Palmares, instituição pública brasileira vinculada ao Ministério da Cultura, o Dia da Consciência Negra é fundamental para “refletir sobre a contribuição da cultura negra em nossa sociedade”.
“A Consciência Negra simboliza o entendimento que, sobretudo, as pessoas negras possuem sobre o valor da sua cultura e a importância de se reconhecerem como indivíduos que possuem direitos, como qualquer outro. Dessa forma, a busca pela justiça e igualdade se tornou uma luta mais que necessária para essas pessoas”, completa o órgão institucional.
Consciência Negra: Data é importante para a identidade negra no Brasil A lei 10.639/2003 estabelece a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira nas disciplinas que já fazem parte das grades curriculares dos ensinos fundamental e médio.
A partir disso, fatos históricos que antes eram exclusivamente europeus foram desconstruídos e deu abertura para o estudo das culturas africanas nos estados brasileiros. “Esses povos marcaram sua cultura nos estados em que houve uma predominância deles. Por exemplo, você vai a Salvador e encontra uma cultura dos povos iorubá nigerianos. Em Pernambuco e no Ceará, há predominância da cultura congo angolana”, expõe Hilário Ferreira.
Portanto, a grande importância do dia da Consciência Negra é o debate sobre a identidade negra africana do cearense e do brasileiro.
Segundo Ferreira, essas discussões evitam reproduzir discursos racistas: “Quando você não aprofunda esse debate, reproduz uma narrativa de uma produção do conhecimento conservadora: considerar o continente africano um país”.
Consciência Negra: As lutas não devem serem lembradas apenas no mês de novembro
Além da importância de valorizar a cultura afro-brasileira, é necessário não limitar os debates e as reflexões apenas ao mês de novembro. Hilário percebe que, quando o mês acaba, as questões são invisibilizadas: “Nos outros meses é como se nós não existíssemos e o racismo continua. Depois do dia 30 de novembro, a vida volta ao normal”.